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O PREÇO DA VIDA E O CUSTO DA GANÂNCIA

         

         Ao que pese toda comoção causada por essa tragédia que interrompeu vidas de jogadores e jornalistas, não podemos fingir que não há responsáveis e que tudo é fruto do destino. A Chapecoense e os veículos de imprensa devem ser responsabilizados não pela queda do avião, mas por colocar seus funcionários numa empresa mequetrefe, de um único avião onde o dono era o piloto e negociador.

         Quando se trata de vida, não devemos escolher o caminho mais barato. Essa empresinha aérea boliviana de uma única aeronave que sequer tinha um piloto - pois o dono desempenhava tal função – operava voos sem seguros, sem recursos para reabastecimento e com manutenção da aeronave suspeita. Há um antigo ditado – quando a esmola é muito até o santo desconfia.

         A empresa Lamia conseguia voos oferecendo um preço bem abaixo do praticado por outras empresas. Essa diferença significativa de preços e a estrutura precária da Lamia foram negligenciadas pelo clube da Chapecoense e também pelos veículos de imprensa. Fox, Globo e SBS colocaram seus jornalistas de carona a fim de não ter despesas de viagem com seus funcionários. Clube e imprensa foram negligentes. A título de cortar despesas, fingiram não saber de um fato claro: a empresa Lamia não oferecia as mínimas condições de segurança.

         Os empresários e donos da Chapecoense, tão elogiados por uma administração enxuta, responsável por pagar suas contas em dia e não atrasar pagamento de salários, não se preocuparam em, deliberadamente, optar por um custo menor em detrimento da segurança de vidas. Foi um preço caro demais. Impagável. Evidentemente que, ainda que tivessem optado por empresa aérea de porte, tradicional e confiável, há sempre possibilidades de acidentes. Mas quando se escolhe uma empresa como a boliviana Lamia, as possibilidades são infinitamente maiores. Empresa essa que nem pode ser responsabilizada judicialmente, afinal a Lamia tinha apenas um avião e o dono-piloto morreu na tragédia.

         Quando o piloto-dono decidiu não fazer o reabastecimento em Bogotá, antes do seu destino Medellín, o fez basicamente por dois motivos. Primeiro, talvez, por não ter recursos financeiros para abastecer. Empresas como a Lamia não abastecem a prazo. Somente pagamento antecipado. O segundo motivo, certamente, é o fato de que qualquer parada para abastecimento aumenta os custos da viagem. E quando se tem um custo já mitigado, a parada poderia ser determinante para um prejuízo operacional. Creio nos dois motivos.

         Globo e Fox não são empresas de fundo de quintal. São grandes! Assumiram o risco ao buscar diminuir custos. Se a Chapecoense tivesse contratado uma empresa de renome para o voo, então essas duas empresas até poderiam aceitar que seus jornalistas pegassem uma carona. Mas sabedores de que não, ainda assim permitiram e determinaram que seus funcionários entrassem naquele avião. O motivo pelo qual assumiram esse risco é claro: financeiro. Uma razão torpe ao colocar vidas em perigo.



         Filhos, esposas, pais, mães e familiares vão ficar como? A extinta Lamia e o seu falecido dono vão indenizar as famílias das vítimas? Será que os donos da Chapecoense  - diga-se de passagem não estavam no voo – serão responsabilizados por negligenciar o que estava evidente: a empresa não demonstrava as condições mínimas de segurança? Os diretores dos veículos de imprensa não serão responsabilizados por obrigarem seus funcionários a pegar carona numa empresa mequetrefe a fim de economizar?

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